10.10.11

Lé tutu lé tutu bó wá


Maria Stella de Azevedo Santos
Ainda de pouco conhecimento da sociedade é o fato de no dia 25 de maio se comemorar o Dia da África. Data escolhida porque em 1963 a Organização de Unidade Africana, hoje com o nome de União Africana, foi fundada, com o objetivo de ser, internacionalmente, a voz dos africanos.
Hoje, dia 25 de maio de 2011, o Terreiro Ilê Axé Opo Afonjá está recebendo uma média de cinqüenta professores da rede municipal, juntamente com seu secretário, para conosco comemorar este dia, que se constitui em uma tentativa de que os olhos e os corações do mundo se preocupem e se ocupem de cuidar do povo desse continente, mas também de aprender e apreender sua sabedoria, que como neta de africana e iniciada em uma religião que tem em África sua matriz, foi a mim transmitida.
Oportunidade que tudo faço para não desperdiçar. Muitas sementes da sabedoria dos africanos, em mim plantadas, ainda não encontraram terreno fértil para germinar, mas não desisto e, por isso, cuido desse terreno em todo momento. Outras há, no entanto, que cresceram e até deram frutos.
Foi assim refletindo que resolvi homenagear o berço da humanidade – a África -, aproveitando esse precioso espaço de comunicação que a mim foi concedido para, humildemente, tentar espalhar essas sementes, na esperança que elas caiam em terrenos férteis.
Foi através da tradição oral, chamada na língua yorubá de ìpitan, que entrei em contato com a maravilhosa arte de viver do africano, que tem na alegria um de seus fundamentos. Entretanto, nós brasileiros, que temos nesse povo uma de nossas descendências, não devemos correr o risco de sermos megalomaníacos e considerar a filosofia africana a melhor.
Todo povo possui sua sabedoria, mas Sabedoria, assim como Deus, é uma só. A mesma base, os mesmos fundamentos, apenas transmitidos de acordo com a cultura e o lugar de viver correspondente. Se foi através da tradição oral que aprendi, é agora na escrita, ìwe-kikó, que encontro condições favoráveis para transmitir, para um maior número de pessoas possível, os ensinamentos absorvidos e os quais ainda pretendo assimilar, de maneira profunda.
Conheçamos, então, um pouco do muito que possui a filosofia do povo africano: É na alegria e na generosidade que se encontra a força que se precisa para enfrentar os obstáculos da vida: “Lé tutu lé tutu bó wá” = “Sigamos em frente alegremente, sigamos em frente iluminados, dividindo o alimento adquirido”.
A palavra tem o poder de materializar o que existe em potencial no universo, por isso os africanos falam muito e alto, quando precisam canalizar sua energia em direção ao que é essencial, mas silencia nas horas necessárias. Um orin nos faz entoar: “Tè rolè… Mã dé tè rolè. Báde tè role” = “Eu venero através do silêncio… Eu pretendo cobrir meus olhos e calar-me. Ser conveniente, respeitando através do silêncio”.
Nosso maior inimigo (como também nosso maior amigo) somos nós mesmos: “Dáààbòbò mi ti arami” = “Proteja-me de mim mesma”. O cuidado com o julgamento do outro e também com o instinto de perversidade: “Bí o ba ri o s’ikà bi o ba esè ta ìkà wà di méjì” = “Se vir o corpo de um perverso e chutá-lo, serão dois os perversos”. O respeito às diferenças: “Iká kò dógbà” = “Os dedos não são iguais”. A necessidade de um permanente contato com a Essência Divina que cada um possui: Eti èmí óré dé ìyàn. Àroyé èmí óré dé ìyà” = “Na dificuldade de decisão e no debate, a Essência Divina amplia a visão para argumentar”.
Como se vê, o corpo da tradição oral africana, que é composto de itan – mito, oriki – parte do mito que é recitada em forma de louvação e evocação, orin – cântico de louvação, adurá – reza, ówe – provérbio serve para nos disciplinar.
Entretanto, nenhuma sabedoria tem mais valor do que a filosofia do ìwà, palavra que pode ser traduzida como conduta, natureza, enfim, caráter. Devemos estar atentos aos nossos comportamentos. Pois, como falam os africanos após enterrar um amigo, “ó kù ó, ó kù ó ìwà ré”, querendo dizer, “não podemos lhe acompanhar no resto de sua viagem, agora só fica você e seus comportamentos”.
Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá

2.10.11

Não apresse o rio

“Não apresse o rio” – diz um pensamento hindu. A vida tem seu próprio ritmo e suas próprias regras. Ninguém muda coisa alguma, se não tiver a paciência necessária.
Mas, para viver em paz durante o tempo em que a vida age processando as mudanças, é preciso saber viver as coisas como elas são, enquanto elas assim forem. Em outras palavras, é preciso saber aceitar o inevitável, enquanto ele for uma realidade em sua vida.
Ser feliz é algo que vem de você aceitar que tudo o que está na sua vida hoje tem uma razão para estar ali. E vai passar, no seu devido tempo.
Daniel era um rapaz bastante interessado nos aprendizados sobre a vida, e estava intrigado naquele dia. Não conseguia entender como seu mestre, Jonas PahNu, vivia tão tranqüilo e sereno, apesar de todas as atribulações que havia em sua vida. Não conseguindo conter-se mais, perguntou a Jonas:
− Mestre, qual é o segredo que você guarda, que o faz estar sempre bem?
Jonas, como sempre, sem dizer uma só palavra, tomou Daniel pela mão e o conduziu a seu quarto. Lá chegando, apontou para uma pequena placa que estava pendurada sobre a cabeceira de sua cama e disse:
− Eis o segredo de minha tranqüilidade e de minha felicidade. Recebi essa placa de meu Mestre. Leio essa mensagem todas as manhãs ao levantar-me e todas as noites ao deitar-me, para nunca esquecer dessas palavras.
Daniel se aproximou da pequena placa e, então, leu:
'Nesta vida nada é por acaso. Tudo tem uma razão de ser. E mais: nesta vida tudo passa. Quando cessa a necessidade de um acontecimento em nossa vida, quando aprendemos a lição que há para nós nesse acontecimento, então ele se vai. Ele passa e dá lugar a novos acontecimentos, com novas lições de vida. A vida é um renovar constante, é uma lição contínua. Na vida tudo passa!'
Daniel sorriu para Jonas e juntos saíram para viver mais um dia feliz."
As coisas boas passarão, as coisas ruins também passarão. Por isso a felicidade vem do bom senso de aceitar o inevitável, com a paciência necessária para esperar que tudo passe..
A partir do momento que paramos de gastar energia lutando contra o inevitável – e damos à vida o tempo necessário para resolver esse problema -, passamos a acumular condições para transformar a nossa vida em algo melhor. Passamos também a ver com mais clareza onde usar essa energia economizada. Tudo começa a ter uma perspectiva melhor, então. E isso favorece a felicidade.
Seja mais feliz, aprendendo as lições de cada acontecimento e tendo a tranqüilidade de saber que “Tudo passa após cumprido o seu propósito em sua vida".
Gilberto Cabeggi

O Suicídio na visão do Candomblé

Nossa reação diante da morte natural depende muito da idade que o indivíduo se vai.
Acreditamos na vida espiritual após a morte e que, a medida que o corpo envelhece, chega um momento em que ele pára e o espírito se parte, porque acreditamos que um espírito jamais morre.
Conseqüentemente, a morte é uma chamada para uma grande celebração quando a pessoa morre em idade madura.
Quanto mais velho for o falecido, a maior celebração. No entanto, não há celebração alguma se uma pessoa morre na tenra idade, quando ainda criança ou antes dos quarenta e poucos anos.
É muito comum os pais não assistirem ao funeral de seus filhos, como explica o ditado yoruba:
Possa voce jamais entrerrar um filho, e possa seu filho atingir a velhice. 
Ocasionalmente, há uma celebração mínima pela morte de um jovem adulto, se o pessoa já tiver filhos com idade suficiente para entender o impacto da pessoa falecida em suas vidas, assim, os filhos compreendem que estão celebrando a vida de seus pais falecidos.
O suicídio é um tabu. Nenhuma celebração. O enterro é muito rápido e breve. Não envolve qualquer cerimônia de elaboração, além de orações e dos procedimentos de praxe , pois o suicídio é desaprovado, e visto como um sinal de fraqueza. Eventualmente realizamos rituais de sacrifício para garantir a redenção da alma da pessoa falecida.