sábado, 5 de dezembro de 2009
Assalto de Orixás
Ildásio Tavares
Antigamente, era a polícia, invadiam os pejis, profanavam os orixás, arrebentavam tudo, tudo destruíam em nome da lei, lei que acobertava os desmandos do poder mas queria exterminar a religião de um povo oprimido.
Será que alguém, calmamente sentado em frente a seu televisor pode imaginar ser arrancado de sua cadeira e, impotente, ver toda sua família desbaratada, acorrentada, vendida, vilipendiada?
Será que alguém pode imaginar a travessia do Atlântico, num porão infecto, arrumado aos magotes, como carne para o açougue.
Os holandeses de Pernambuco traziam 500 escravos num iate, num tráfico de trocas injustas.
Uma partida de fumo rendia mais de cem escravos que eram convertidos em várias partidas de fumo que eram trocadas por centenas de escravos.
Em três ou quatro viagens o traficante podia comprar terras, se estabelecer.
Melhor que cavar ouro.
Os remanescentes deste tráfico tiveram, na diáspora, seus mecanismos de sobrevivência e neste processo a cultura é fundamental – a religião um esteio.
Uma super-raça se formaria.
Em torno de seus sagrados orixás.
O Ilê Axé Opô Afonjá vai fazer cem anos em 2010.
Cem anos que Eugênia Ana dos Santos plantou o axé de Afonjá no São Gonçalo, num gesto de majestade que ecoaria em grandeza.
Verdadeira estadista, Mãe Aninha governou o axé com hábil mão política, tendo sido seu principal artífice.
Por fortuna, logo ao se apossar dos 155mil m2 do Axé, descobriu uma fonte copiosa e em torno dela fez a casa de Yemanjá, assentando sua Yemanjá da nação de Grunci. Em seguida procedeu aos trâmites do Axé.
O Ilê Axé Opô Afonjá é uma réplica do Reino de Oyó, em 1839 destruído pelos árabes.
Ela, era a suprema sacerdotisa, a Iya Nassô.
O Balé Xangô, era Theodoro Pimentel pai de Mãezinha, futura Iyalorixá da casa.
O Xangô assentado respondia pelo santo.
Quando surgiu disputa com o Balé Xangô, Mãe Aninha criou o corpo dos doze obás de Xangô, ampliado para 36 por Mãe Senhora, outra estadista como Mãe Stella...
A fina flor da inteligência, da arte, da literatura baiana têm pertencido a esta casa.
Jorge Amado, Carybé, Genaro de Carvalho, Vivaldo Costa Lima, Pierre Verger, Vasconcellos Maia, Dorival Caymmi, Demeval Chaves, Gilberto Gil, Camafeu de Oxosse e Muniz Sodré, são alguns dos obás que dignificam e dignificaram a casa.
Ouço dizer com indignação que vândalos inescrupulosos invadiram e depredaram a casa de Oxalá na calada da noite.
Um absurdo!
A casa de Oxalá é um dos poucos exemplos que conheço de um compound africano na Bahia, morada coletiva e santuário de Oxalá, o orixá supremo, e das Aiabás.
Crime, profanação, sacrilégio, a polícia tem que tomar providências urgentes.
Imaginem se invadissem a Igreja do Bonfim.
Seria uma celeuma nacional.
Mas invadir um templo negro arrisca-se ao pouco caso. Coisa de preto.
Pouco caso que não pode existir na Bahia, Sr. Governador.
O senhor é judeu. Sabe que, quando começam perseguições étnicas como esta a coisa pode virar e, geralmente, os judeus são as primeiras vítimas.
É preciso acabar com essa Inquisição contra a raça negra.
Com esses Progroms.